Pedro Cunha: o meu amigo diácono.

Para o poupar de mais um testemunho que lhe fosse ocupar a preenchida agenda, propus ao nosso recém-ordenado diácono uma conversa de amigos a propósito da sua ordenação no passado dia 8 de dezembro. Prometi fugir das perguntas óbvias e dos temas mais eclesiásticos e clericais, pois desses haverá quem tratará melhor que eu. Para já, estivemos a pôr a conversa em dia e a partilhar um pouco do Pedro, para que mais o possam conhecer melhor.

Entre gargalhadas e explicações, começámos pela sua apresentação “Sou o Pedro Cunha, tenho 27 anos, sou de Besteiros, Paredes. E, de momento, sou estagiário na Paróquia de Moreira da Maia, que tem um grandioso mosteiro. E, recém-ordenado Diácono.”

Começando pelas perguntas fáceis, propus que nos contasse sobre o seu dia-a-dia. “Dia típico do meu estágio? Acordo todos os dias às 8 da manhã. Como e rezo laudes com o meu orientador de estágio. E, todos os dias são diferentes, e esta é a parte boa. Pode ter coisas más mas acho que é a parte boa. Todos os dias são diferentes. Vou organizando as manhãs e tardes com o meu critério, consoante o trabalho que houver.” Mas caso haja escolhas a fazer, respondeu que tranquilamente dividiam as tarefas e que conversando entre os dois havia tempo para tudo.

Continuando dentro do tema do estágio, quis saber sobre algum momento que o marcou neste período. Após uma pausa para pensar, falou de uma situação recente numa celebração da palavra em Gemunde: “Na semana passada, havia umas bodas de matrimónio, que foram surpresa tanto para os noivos como para mim. […] Mas teve um impacto mais emocional, porque aquele casal com 50 anos de matrimonio, nem sem como explicar… mexeu com eles, e notava-se isso. Também por ser diante de toda a comunidade. No final estive a falar com eles um pouco. Certamente não foi uma experiência propriamente extraordinária mas que levou-me a perceber que há pequenas coisas que fazemos que têm impacto. Já houve crianças que vieram ter comigo e disseram ‘na semana passada, eu fiz o que pediste’, a propósito de algum desafio que deixei na catequese ou numa celebração da palavra. Faz-me perceber que estas pequenas coisas tem impacto, e é nestas pequenas coisas que às vezes se consegue fazer chegar esta presença de Jesus. Pequenas conversas, pequenas celebrações, no ‘tu-a-tu’ consegues fazer chegar mais Cristo aos outros do que em coisas muito grandes.”

Do dia-a-dia passámos para um dia mais especial. Sobre o dia da ordenação, que começando por uma vasta gargalhada, acrescentou: “Foi um dia atípico. Lembro-me muito pouco da celebração. Tenho umas vagas ideias, tenho consciência do que fiz, mas foi um dia… só consegui comer depois da celebração. A minha mãe obrigou-me a beber um iogurte de manhã, mas só isso. Tudo passou tão rápido que no fim do dia ainda estava a absorver o que se tinha passado. Mas foi, sem dúvida, um dos dias mais felizes da minha vida até agora.”

Decidimos recordar um pouco da sua experiência no Movimento Oásis. Entre gargalhadas sobre o facto de ser ele quem publica o Crescer Online, perguntei sobre algum momento ou palavra de alguma das Consagradas do Ancilla Domini que recordasse com carinho. “O que acho que trouxe mais impacto, não é um momento especifico, mas vários momentos. O facto de todas aquelas [Consagradas do Instituto] com quem contacto mais frequentemente têm uma constante preocupação. Ligam-te, porque precisam de falar contigo, mas antes de falar contigo tentam saber em que estado te encontras. Como eu estou, lá em casa, os meus pais. E isso refletiu-se quando parei um pouco para repensar o meu percurso vocacional. Afastei-me um pouco, mas nunca perdi contacto, e durante esse tempo em que parei para pensar no que Deus queria para mim, para poder tomar uma opção segura, de todas elas recordo coisas que me foram dizendo e que me faziam pensar e rezar e discernir nesse período curto mas intenso.” Sobre o Movimento de uma forma mais geral falou-me do crescimento como animador e como isso transborda para o que espera ser o seu ministério. “No oásis há muita coisa que me marcou. A Joana esteve comigo num primeiro acampamento que fiz, e ela é uma pessoa adorável mas que me ensinou algumas coisas de forma mais incisiva. Eu brinco muito com isso mas recordo com carinho. A Joana uma vez chamou-me à parte e começou a dizer ‘o que estás a fazer?...’ mas isso ajudou-me a crescer como animador. O Oásis também me deu isto. Para além da espiritualidade, também me deu ferramentas para o meu futuro ministério. Eu não era tímido, mas tinha problemas em falar em grandes grupos, e a Ana disse-me ‘O oásis é o espaço para experimentares, para perceberes o que funciona ou não. Arrisca. Se algo sentes que não chega ao coração dos jovens, há de vir alguém que corrige e faça com que o encontro valha a pena, mas não tenhas medo de arriscar.’ E ao oásis foi isto para mim. Nisso fui um sortudo em ter este espaço. Até por estimular a criatividade. É chato, às vezes, ter de preparar algo no meio de outros trabalhos, mas ao mesmo tempo estimulaste a criatividade e chegas ao fim e até dizes ‘Olha ficou algo porreiro’. É uma ferramenta pastoral incrível! E, é uma coisa boa aqui: a maioria das pessoas são sinceras em dizer ‘Esquece, isso não dá’. E, isso também ajuda a crescer.

Lembrei-lhe de me contar uma vez, que se comoveu a ler a biografia do Pe. Rotondi. “Não me lembro ao certo o que me comoveu. Eu li a biografia… tenho uma ideia geral. Foi bom perceber a pessoa que ele era. Um homem que imagino seria carismático, em particular com os jovens. E, a biografia termina com os dias finais dele. E, a forma como estavam relatados esses momentos finais depois de ler sobre toda a sua vida… estava em retiro, e dei por mim a chorar sozinho no quarto à noite quando acabei de ler a biografia.” Tive de saber mais perguntando sobre uma característica que gostaria de levar para o seu minstério. “A alegria dele… eu, se calhar, gostava de ser mais assim. Por causa do Crescer Online, nós temos acesso a imensas fotografias. E, ele aparece muitas vezes rodeado de malta jovem e aparece sempre sorridente. Certamente, também teve momentos baixos como é normal na vida, mas ou tinha sorte de ter fotógrafos bons ou soube levar uma vida alegre e partilhar isso. Gostaria de levar isso. Certamente, não me sinto tão carismático como ele. Mas se for tão alegre e feliz, certamente já será bonito.”

Falando da sua vida, quis explorar um pouco a sua história. Quando perguntei sobre o que o Pedro de 12 anos acharia sobre o de hoje, a resposta chegou sem hesitação: “Estaria orgulhoso. Eu faço esse exercício e lembro que nessa altura já havia alguma ideia de ser padre, ainda que a ideia fosse e viesse. Mas, pensando se o que projetei corresponde ao que sou hoje. Estaria orgulhoso. Nesse sentido de ‘até correu bem… safaste-te!’ (risos) Vamos vivendo e vamos tentando ser o melhor de nós mesmos.”

Nesta linha, tive de perguntar se nunca houve um caminho alternativo que tivesse considerado com seriedade. “O que toda a gente previa aos meus 16 ou 17 anos era que eu optaria por engenharias e informática. Era um interesse meu. Sempre tive isso presente. Agora… isto é um clichê… mas isto não é uma opção profissional, isto é uma opção que transforma a nossa vida. Isto é a nossa vida! Nenhum outro ramo que eu pudesse ter optado, me deixaria tão feliz como estou hoje. No outro dia, perguntaram-me se deixaria de seguir ser padre se ganhasse o Euromilhões. Mas, não haveria nada no mundo que me deixasse tão feliz quanto esta opção vocacional. Nada mudaria isso. Não quero que isto fique confundido… ou seja, isto não é uma opção profissional entre outras. Isto é muito mais que uma opção profissional. Isto é a nossa vida! Transforma-se na nossa vida! Nada me faria tão feliz. Não sei se isto responde à tua questão.” (risos).

Já a chegar ao final tive de perguntar sobre outra figura que o Pedro sempre falou muito. “Sempre tivemos uma relação de amor-ódio, uma coisa muito normal com irmãos mais velhos… dessas disputas. Mas, é engraçado a minha mãe, hoje, recorda que ele sempre foi muito protetor quanto ao irmão mais novo, e eu sinto que isso continua. E, agora que nos aproximamos a nível geracional, acho que consigo retribuir muito disso. Eu sinto que sou das poucas pessoas que ele consegue levar a sério o que digo. E a nossa relação tem-se pautado por isso. Ele ajuda-me quando preciso e eu ajudo-o quando precisa.”

Quis terminar com um aspeto do Pedro que sempre me fascinou e que de certa forma está um pouco conectado com o segundo ponto da espiritualidade oasista. O Pedro sempre foi uma pessoa atenta ao que se passa no mundo e nas redes sociais, e sempre conciliou bem esses interesses com a sua opção de vida. Tive de perguntar se isto é fácil ou exigente. “Um grande amigo meu diz que sou a pessoa que consome mais informação inútil que ele conhece. Eu jogo, ouço musica, leio,… Desde miúdo e ainda hoje continuo a fazer isto. Mesmo interessando-me mais pela vida eclesial e os meus hábitos de leitura terem mudado. Mas, não perdi os hábitos antigos de interesse cultural e cultura pop. Por exemplo, agora tenho descoberto contos de Lovecraft e Edgar Allen Poe. Mas não é difícil porque sempre vivi atento a tudo isso. Não me custa, está dentro dos meus interesses. E eu sou uma esponja a absorver essa informação.”

Insisti, para perceber se era fácil esse equilíbrio dentro do contexto de formação e estágio. “Acho que não faz sentido que em pleno 2023… certo de que há meios culturais incompatíveis com os meios da Igreja, mas este não é um deles. Não é incompatível, é um interesse como outro qualquer. Eu gosto de cultura pop. Como me interesso por isto, podia interessar-me por outras coisas. Eu considero-me uma pessoa eclética. Faz falta haver propostas com impacto nas gerações mais novas com presença nas redes sociais. Mas, digo uma coisa bem feita. Falta isso na Igreja portuguesa também. Dá para fazer uma leitura da mensagem de Jesus noutras coisas que podem parecer mais levianas, mas que têm algum substrato mais profundo.”

Para terminar, perguntei sobre uma pessoa não muito óbvia mas que tenha tido impacto no seu caminho. “Os motores da minha vocação foram os amigos. Tanto os que trago de Paredes, da infância e adolescência, como os amigos do seminário. Porque foram quem partilharam os momentos bons e maus. Tanto fizeram festa como chamaram à parte para chamar a atenção. E, animaram quando estava em baixo. Foi o bom de ter amigos próximos no seminário também, teve essa parte boa. E, tanto os de um lado como de outro foram os que fizeram com que a máquina fosse para a frente. Para que as coisas fossem como são hoje.”

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"Ser cristão: amar Jesus, na Igreja e no Mundo": 20 a 22 de janeiro de 2023.

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Recordar Padre Rotondi.