«Braços abertos» de Alberto Vieira.
Fotografias da autoria de Flávia Vieira
Depois de ter partilhado as imagens das Esculturas de Alberto Vieira com alguns amigos, que podem ser visitadas na Sala de Exposições Temporárias do Tesouro da Sé de Braga até 31 de outubro de 2021, foi-me pedido para dizer por que razão esta exposição é, para mim, de visita obrigatória.
O “Abraço de Cristo” é o elemento unificador desta exposição. Algo nestes braços, amplamente abertos e quase desproporcionais, me inquieta. Este gesto de abraçar tem vindo a ser recorrente nas abordagens do Alberto quando nos fala de Cristo e o representa em barro, esse material que nos liga à terra e que ele tanto o dignifica.
Este trabalho obedece a um tema, mas este abraço pode ser de Cristo mas também pode partir de nós. O poder de um colo apertado neste tempo de pandemia, vem precisamente ao encontro desta nossa carência de afeto, que nos afastou estes meses, lançando-nos num fosso de distância e esquecimento. Esse abraço que tanta falta nos faz e que nestas esculturas se repete num gesto simples, que em cada uma destas figuras se transforma num convite ao amor e à partilha.
“Para mim, Cristo na Cruz, é mais uma figura de braços abertos do que crucificados” revelou o escultor.
Nesta exposição e perante o trabalho de Alberto Vieira, sinto que cada imagem se revê no impulso do autor que o persegue. Este tema não se esgota nesta exposição, esse incessante desenho de Cristo reflete-se em cada detalhe. Nas matérias que se fundem, podemos observar todo o sentido e emoção que se alicerçam em tantos significados. Consigo ler em cada escultura esta eterna procura de quem é Cristo afinal, e qual é para o autor a que retrata mais a sua ideia sobre “Aquele” que sendo de todos não é de ninguém.
Há uma figura predileta do artista, cabeça de barro que se cruza com um arame retorcido de uma videira velha, tornado corpo desse Cristo. Alberto contou-me a história de um homem velho que vivia miseravelmente, a videira pertencia-lhe, fazia todo o sentido ali e lhe lembra as entranhas, desde a analogia ao vinho convertido em sangue de Cristo, até às mãos e pés com os dedos feitos raízes no destorcer do arame, que desprendidas, despojadas de tudo, principalmente dos bens materiais, reportam a uma das maiores mensagens desse Jesus que expulsou os vendedores do templo.
Percorrer a exposição ao lado do autor é maravilhoso. Poder compreender a mistura das matérias, o porquê daquele tronco velho e a história que esconde. Podermos ver ao detalhe, que aquele nó da madeira coincide com os nós dos cotovelos dos braços abertos.
Olhar depois um outro abraço de Cristo, numa outra escultura, com o corpo feito nessa madeira tão antiga, depois de saber que pertenceu a uma casa e conhecer assim a forma deliciosa como chegou às mãos do escultor, é olhar Cristo pelos olhos do autor. É conhecer a alma daquela escultura, que depois de exposta é devolvida ao observador.
Um convite à interação permanente com o visitante, uma história que se reinventa numa outra história e passa a ter um novo sentido, uma outra narrativa, como um reencontro com “Aquele” que para quem o olha, pode levar a algo mais transcendente do que o primeiro intuito. Pois a obra de arte depois de exposta deixa de ser do autor e passa a ser de quem a transporta na memória e que de alguma forma lhe tocou.
Não há palavras que melhor definam Cristo, não há maior explicação do que na forma de o dizer em Arte. Como num poema, a Arte exprime o indizível e nos eleva mais próximo do sublime.
Quem melhor do que um artista para nos falar da paixão de Cristo? Quem melhor do que um homem que, através da sua arte, tão simplesmente imprime na matéria orgânica que é o barro, toda uma paixão em saber fazer?
O artista entrega-se pela obra numa total doação, esse dom que o aproxima do divino, que toca apenas alguns, esses escolhidos.
“A utilização da figura de Cristo faz sentido para a Igreja Católica, mas não deixa de ser uma apropriação, porque Cristo é de todos. Esse homem sem tempo, a relevância que ainda tem, continua eficaz e as pessoas olham para essa figura que as questiona, como se as olhasse. Há uma permanência no tempo.” Esta partilha do autor, explica esse seu fascínio pela figura de Cristo, pois o inquieta.
A partir do dia 15 de Abril e até 31 de Outubro vai ser possível visitar a exposição de escultura de Alberto Vieira “Braços Abertos”, no Tesouro-Museu da Sé de Braga.
A exposição está acessível de Segunda-feira a Sábado, entre as 10h00 e as 13h00 e entre as 15h00 e as 18h00.
O acesso é feito a partir da Loja do Museu, situada na Rua D. Diogo de Sousa, nº 114.
A entrada é gratuita.
Alberto vieira desenvolve o seu trabalho desde 1986, nas áreas de cerâmica, vidro e outros materiais.
Realizou exposições individuais e coletivas em museus e galerias e participou em projetos de arte urbana. Das exposições individuais, destacam-se as realizadas no Paço dos Duques de Bragança em Guimarães (1994), no Museu da Olaria de Barcelos (1995), nas comemorações do Bimilénio da cidade de Braga (2000), no Museu Alberto Sampaio em Guimarães (2007) e no Museu da cidade de Aveiro (2019). Participação em Bienais e exposições coletivas:
Bienal Internacional de Cerâmica de Aveiro, Bienal de Cerveira; Feira de Arte de Gant na Belgica; World Ceramic Biennal Korea; Exposição coletiva do Museu do Vidro da Marinha Grande- Contemporâneos; Biennale Internacionale Ceramique Coraine Contemporaine Vallauris, Internacional Ceramic &Glass Art Exchange Program 2008-2009 (Japão); Bienal de Cerâmica d’Esplugues (Barcelona) e exposição da Associação de Ceramistas da Catalunha em Barcelona (2020)
Prémios: 1º prémio Concurso Design Cerâmico, (Caldas da Rainha, 1992);
1º Prémio no IV Prémio Edinfor de Escultura (1998);
Prémio Baviera na XII Bienal Internacional de Cerâmica (2003)
Prémio Diputació de Valencia na VI Bienal Internacional de Cerâmica (2003)
Grande prémio da 7ª Bienal de Artes Plásticas da Marinha Grande (2008),
3ª Prémio Bienal Internacional de Cerâmica Artística (Aveiro,2015),
Prémio VIARTES 2015 –Concurso de Arte Pública (Porto 2015 em Coautoria)
1º Prémio da Bienal internacional de Cerâmica artística (Aveiro, 2017).
Participou em residências artísticas em Barcelona (Espanha) e Seto (Japão).
O seu trabalho está representado em coleções particulares, espaços públicos e museus nacionais e estrangeiros.